Wednesday, April 20, 2005

TR13ZE – No limiar da idade maior!

Treze — Inocência Perdida
(Thirteen)
Realização: Catherine Hardwicke
Intérpretes: Evan Rachel Wood, Nikki Reed, Holly Hunter, Jeremy Sisto, Brady Corbet, Deborah Unger, Kip Pardue
EUA/Grã-Bretanha, 2003

Quando é que se deixa de ser criança e passamos à idade maior? Parece ser a questão que paira no ar do filme de estreia como realizadora de Catherine Hardwicke. O tema da juventude “problemática” começa a ser recorrente no cinema norte-americano, tornando-se nesta última década um estilo perfeitamente assumido, com uma proliferação anual de obras importante, sobretudo no seio de um certo cinema que se gosta de intitular como independente (não deixa de ser interessante verificar que nos últimos anos os prémios mais importantes do cinema independente americano, como o Sundance Award ou o Independent Spirit Award, tenham recaído em obras que tratam, de uma maneira ou de outra, este tema).

De tal maneira é assim, que este tipo de filmografia possui já os seus próprios consignatários: desde o reputado e galardoado Gus Van Sant (Gerry, Good Will Hunting e Elephant), ao polémico e duro Larry Clark (Kids, Ken Park e Bully), sem esquecer Richard Kelly (Donnie Darko) ou Scott Kalvert (Basketball Diaries e Deuce Wild). Todos eles, cada um à sua maneira, se têm empenhado no fabrico de filmes de culto tendo como base esta temática. Faltam-nos ainda os próximos filmes de Hardwicke para confirmarmos se também ela se posicionará definitivamente neste patamar da produção cinematográfica norte-americana. De qualquer maneira, Treze inscreve-se neste rol. Por muito que se tente evitar a comparação, o filme não deixa de nos transmitir a sensação de que se trata de uma aproximação clean (limpinha) do universo tão bem explorado até às suas últimas consequências e sem condescendência por Larry Clark nas suas obras: ou seja, o retracto de uma adolescência à beira do abismo, em rota de colisão.

Apesar de deixar de lado a lente obscura, como acontece em Clark, e optar antes por um registo de cores fortes e de fontes luminosas (aqui Sunset Boulevard torna-se o cenário ideal pare este filme), a realizadora utiliza todas as outras técnicas recorrentes neste tipo de cinematografia: como o uso da câmara tremula e nervosa (recorrendo, até ao máximo das suas possibilidades, da objectiva manual); a incursão aqui e ali de momentos cuidadosamente preparados do ponto de vista da imagem fotográfica; o ritmo acelerado da composição e transposição das cenas na montagem do filme e finalmente o trabalho de actores suportado na expressão e performance de talentos jovens e desconhecidos.

Paralelismos à parte, Treze é um bom filme. Situa-se num universo em que o essencial passa por uma visão crua da adolescência e, mais do que isso, pela desagregação da relação familiar tradicional. Uma obra surpreendentemente intimista. Para este facto, muito terá contribuído Nikki Reed, uma das interpretes principais do filme cuja participação na escrita do argumento, muito baseada na sua visão autobiográfica, se demonstra aqui decisiva. Sem dúvida que Nikki Reed, com treze anos na altura da produção do filme, providencia uma série de detalhes e nuances que Hardwicke teria alguma dificuldade em compor sozinha de forma tão fidedigna. Por outro lado, uma das grandes bases do filme é, indubitavelmente, a magnífica representação da bela Evan Rachel Wood, impondo-se de forma muito intensa e segura ao longo de todo a sua interpretação como protagonista principal. É ela que confere todo o sentido dramático ao filme. O futuro ditará se estaremos ou não em Treze perante o emergir de uma grande estrela de cinema. A sua interpretação de uma adolescente de 13 anos chamada Tracy descobrindo um mundo completamente novo e sedutor repleto de drogas, sexo e divertimento, sem preocupações, quando inicia uma amizade com a sedutora e problemática Evie Zamora (Nikki Reed) é aqui simplesmente genial e não tenhamos ilusões, a maior parte da força do filme passa por ela. Em termos de casting é inevitável sublinhar o desempenho de Holly Hunter, uma actriz que impõe sempre um registo de elevado nível às suas prestações no grande écran. O seu papel de uma mãe a tentar conciliar o inconciliável no seio de uma família desmembrada da sua estrutura tradicional seria mesmo reconhecido pela academia americana ao nomeá-la para o Oscar de 2002. Holly Hunter estabelece, juntamente com Nikki Reed e Evan Rachel Wood, um triângulo perfeito na composição das personagens motoras do filme. Estamos assim, perante uma obra sem o pretenciosismo artie (artístico) que muitas vezes se aponta ao cinema que trata o tema da adolescência e juventude “problemática” mas que antes suporta toda a sua energia na qualidade das interpretações baseada numa concepção simples do guião e realista das personagens. Quem sabe, a melhor maneira de compreendermos uma certa cultura kinky e kitsh que parece contagiar esta geração que usa o piercing e a parafernália endomentária não só como meio de sedução mas igualmente de afirmação e desafio em relação a um mundo que tudo dá mas que também tudo tira.
Uma nota sobre Catherine Hardwicke
Hardwicke tem um longo trajecto na área da cenografia incluindo títulos recentes como Three Kings ou Vanilla Sky. Entretanto, ainda este ano, deverá estrear como realizadora Lords of Dogtown, projecto cuja direcção chegou a estar entregue a David Fincher (manteve-se ainda assim na produção). Quanto a Treze, o seu primeiro trabalho de realização, é um magnífico exercício de cinema, puro e intransigentemente realista. A obra desencadeou uma curiosa polémica quando se atribuiu uma classificação que interditava o filme aos espectadores com treze anos: recebeu o certificado "R" (interdição a menores de 17 anos). Por cá, ocorreria uma situação insólita semelhante, com o filme a ser classificado para maiores de 16 anos. Catherine Hardwicke tem ainda a particularidade de ser uma das mais recente representantes femininas no universo, ainda muito masculinizado, de directores de cinema de Hollywood.

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