II Edição do Ciclo Fio Solto. Na Vida dos Bonecos.



Doze personagens insólitas cruzam-se nesta película mas o que será que têm em comum? Eles são um casal americano comum, um persa dono de uma loja, dois polícias, um africano, director de uma estação televisiva, um mexicano, dois ladrões de automóveis, um polícia a começar a carreira e um casal coreano de meia-idade.À partida, estas pessoas partilham apenas o facto de viveram em Los Angeles, mas nas próximas 36 horas todos eles vão 'colidir' e estes serão forçados a relacionar-se.
Este drama urbano gira à volta das encruzilhadas inconstantes de um conjunto de personagens multi-étnico que luta para dominar os seus medos... Ousado e polémico, 'Crash' lança um olhar provocador e inflexível às complexidades da tolerância racial na América contemporânea.
De louvar o facto de o autor ter optado por não transmitir uma moral absoluta, optando pela posição politicamente correcta: a de que entre vítima e agressor, não existem respostas fáceis.*Óscar 2006 para: Melhor Filme, Melhor Argumento Original e Melhor Montagem
Da sua cama de hospital e perdida toda a esperança, Paul Rivers (Sean Penn) relata-nos o que o levou até ali, numa espera conformada que apenas terminará no final do filme. Fala-nos do coração destruído pelo tabaco, da operação redentora, do desejo de descobrir o dador, do afastamento que se vai instalando entre si e a sua companheira Mary (Charlotte Gainsbourg) que acaba deixando-o e regressando à Europa natal.
Através do seu relato, conhecemos Jack Jordan (Benicio Del Toro), um ex-criminoso reabilitado e redimido pela Fé, em conflito com os seus tutores e discípulos, com a mulher (Melissa Leo) e os filhos, um homem cuja vida se irá cruzar com a de Paul pelas piores razões, apressando o fim deste e inflamando a sua alma com uma imensa e insolúvel culpa.
Drama familiar, Paris, Texas, centra-se na deambulação de um amnésico (Harry Dean Stanton) em busca das memórias de um amor antigo por uma bela mulher, a inesquecível Nastassja Kinski. O filme venceu a Palma d'Ouro do Festival de Cannes e é talvez o mais intenso exercício afectivo de Wenders, que culmina com uma longa cena passada numa cabina de uma loja de sexo, com os dois protagonistas separados por um vidro e a entenderem as repercussões do seu amor. Paris, Texas é um exercício de melancolia inesquecível que questiona os limites da identidade.
Esta é a história verídica de Paul Rusesabagina, o gerente de um hotel, que conseguiu salvar não só a família mas também os milhares de refugiados que aí se abrigaram...
As inspirações
”Se for objectivo, posso afirmar que todas as personagens são muito egoístas. "Fazer uma escolha" significa que à partida temos duas opções. Mas em DOLLS todos os protagonistas estão possuídos pelo seu próprio egoísmo e cada um deles tem a sua pequena ideia do caminho que querem seguir e que atitude têm de assumir em consequência disso. Eles não fazem realmente escolhas porque são incapazes de ver outras soluções. Nenhum dos acontecimentos do filme poderia acontecer se as personagens fossem suficientemente equilibradas para "fazer escolhas". Sendo objectivo, as personagens podem parecer estúpidas, mas elas próprias não se vêem seguramente desta forma.”
”Filmei paisagens absolutamente magníficas, mas queria que tivessem uma certa crueldade. Algumas são de uma beleza extrema como se estivessem à beira da morte, como as flores de cerejeira totalmente abertas no último minuto antes de caírem ou as folhas de ácer que se vestem com as mais belas cores antes de secarem e caírem. Esta crueldade subentendida pode ser aumentada pela presença de personagens à beira da morte... Quando filmo o mar, muito luminoso no Verão, prefiro ter lá um homem velho, abatido pela vida, por exemplo um patrão que acabou de ir à falência, que pensa em suicidar-se ao olhar o mar, em vez de uma família feliz que está a fazer um piquenique na praia. Ou quando filmo um cerejal, prefiro ter lá um soldado da Segunda Guerra Mundial em vez de um grupo de amigos que o contemplam. Poderia ilustrar o que cada imagem representa, mas também é importante não o fazer. Se virem DOLLS e disserem: "Oh, que imagens tão bonitas", ficarei contente. Dito isto, não me importo que procurem um simbolismo nas cerejeiras em flor, no mar de Verão ou nas folhas vermelhas do Outono.”
O teatro de marionetas Bunraku faz parte dos três géneros teatrais principais do Japão, juntamente como Kabuki e o Noh.
A intensidade dramática do Bunraku depende da perfeita organização de três elementos: as marionetas, a narração e a música. Cada marioneta é manobrada por três homens (têm geralmente um metro de altura, são feitas em madeira e pensam entre os 5 e os 20 quilos). Uma perfeita simbiose dos três manipuladores de marionetas é fundamental para dar vida à marioneta. As regras, muito estritas, devem ser respeitadas e nenhum manipulador pode representar independentemente.
Os manipuladores estão em palco, em frente ao público. O principal manipulador aparece de rosto descoberto enquanto os outros são "invisíveis" sob um capuz negro, mostrando desta forma que a marioneta é o actor principal.
Num estrado à direita do palco, o narrador (tayu) recita o texto épico e poético (joruri). Não só conta a história, mas faz também a voz de canta marioneta: mulheres, homens, crianças. Interlúdios e o acompanhamento musical são assegurados por um tocador de shamisen, um instrumento antigo com três cordas.
A história do Bunraku começou no século XVI e popularizou-se no século XVII. Desde 1966 que o Teatro Nacional de Tóquio acolheu o Bunraku. Em 1985, o Teatro Nacional Bunraku foi criado
Apesar do seu sucesso, o envelhecimento dos técnicos (costureiros, fabricantes de marionetas,...) e a falta de pessoas para os substituir representam um problema para o futuro desta arte com mais de 300 anos.
Na primeira história, Matsumoto e Sawako são um casal feliz, mas as pressões das respectivas famílias obrigam-nos a escolher um destino trágico. Para proteger Sawako, Matsumoto liga-se a ela para sempre, unindo os corpos com uma faixa vermelha. Erram sem destino. Procuram aquilo que esqueceram. Uma viagem que vai durar o tempo de quatro estações.
Na segunda história, Hiro, um yakuza, regressa a um parque onde costumava encontrar a namorada. Trinta anos antes, era pobre e viu-se obrigado a separar-se da bela rapariga para abraçar o mundo do crime.
Na terceira história, Hakuma, cujo rosto está coberto com faixas, passa muito tempo a olhar o mar. Pouco tempo antes, ela era uma grande estrela da música que passava a vida a dar autógrafos e a aparecer na televisão. Nukui é o seu maior fã e está disposto a prová-lo.
Três histórias inspiradas nas emoções eternas do teatro Bunraku.
Três histórias delicadamente enlaçadas pela beleza da tristeza.
Três histórias de amor imortal.
Realizado por Trey Parker
EUA, 2004
Team America, uma força internacional destinada a manter a estabilidade global, descobre que um ditador sedente de poder está a fornecer armas de destruição maciça a terroristas. Os heróis embarcam uma incrível missão para, naturalmente, salvar o mundo. O resto é indescritível, ou não fosse o filme da autoria dos criadores de «South Park»...
Integrado na 8.ª edição do Festival Marionetas na Cidade, em parceria com os S.A. Marionetas, a 7.ª à 5.ª apresenta um pequeno ciclo totalmente dedicado ao universo do teatro de marionetas. Quatro propostas de ficção, nacional e estrangeira, sob o formato de curta e longa-metragem, preenchem uma mostra cinéfila pouco convencional que vai desde o registo mais mediático até ao mais intimista e artístico. É oportunidade ainda para visualizar a mais recente produção nacional do género com a exibição de “Dopamina” de Fábio Ribeiro e que apresenta a particularidade de ter José Gil (S.A. Marionetas) na manipulação das marionetas utilizadas na curta.
06_10:
"Team América – Polícia Mundial" de Trey Parker.
13_10:
"Dopamina" de curta-metragem de Fábio Ribeiro
Em órbita (sessões especiais da 7.ª à 5.ª)
20_10:
"Dolls" de Takeshi Kitano
Realizado por Wim Wenders
EUA, 2004
Paul é um veterano de guerra que sofre de paranóia. Após o 11 de Setembro, convence-se que a América está em guerra e começa a patrulhar as ruas de Los Angeles.Lana regressa aos EUA numa missão católica de apoio aos sem-abrigo...e para encontrar Paul, o seu tio.
Apesar das diferenças entre os dois, o assassinato de um sem-abrigo paquistanês, que testemunham involuntariamente, vai aproximá-los...
Realizado por Oliver Stone
EUA, França, Espanha, 2003, Doc.
Nos dezoitos meses que se seguiram ao fracasso da tentativa de estabelecer a paz permanente,
Este é um testemunho cru, isto é, não há grandes considerações sobre o que antecedeu a actual situação, nem os cenários possíveis, Stone centra-se no dia-a-dia de cidades como Ramalah e a posição oficial de cada uma das partes intervenientes. O documentário tem como protagonistas antigos primeiros-ministros israelitas, Shimon Peres, Ehud Barak e Benjamin Netanayu, os diplomatas europeus, Miguel Maratinas e Christian Jereut, Hasan Yosef, porta-voz do Hamas, membros da Brigada de Mártires Al Aqsa, o historiador Meir Pail e o ministro de segunaça pública de Israel, Gideon Ezra. A figura de Yasser Arafat é presença constante ao longo do documentário, pois Stone mostra-nos as dificuldades em estabelecer contacto com ele e a única vez que se encontra com ele, é para figurar ao lado de outros artistas, pintores e escritores, como o português José Saramago.
Este documento fica marcado por ter sido realizado aquando do massacre de Pasadena, onde morrem 28 israelitas em função de um atentado suicida, nos dias seguintes assiste-se à resposta israelita com a destruição do quartel-general de Arafat.
“Persona Non Grata” é acima de tudo um conversa frente a frente com as pessoas que tiveram ou têm capacidade para solucionar o problema ou não…
Na luta do Bem contra o Mal, é sempre o povo que apanha as favas. Os terroristas mataram trabalhadores de sessenta países
Eliminar o Mal? O que seria do Bem sem o Mal? Não são só os fanáticos religiosos que precisam de inimigos para justificar a sua existência. Os bons e os maus, os maus e os bons: os actores trocam de máscaras, os heróis tornam-se monstros e os monstros heróis, segundo as exigências daqueles que escrevem o drama.
Não há nada de novo nisto. O cientista alemão Werner Von Braun foi mau quando inventou os foguetes V-2 que Hitler lançou sobre Londres, mas passou a ser um bom no dia em que começou a dirigir o Império do Mal. Nos anos da Guerra Fria, John Steinbeck escreveu: “Pode ser que toda a gente precise de russos. Aposto que até na Rússia eles precisam de russos. Talvez lhes chamem lá americanos”. Depois os russos tornaram-se os bons. Hoje, Vladimir Putine diz também:”O Mal deve ser punido”.
Saddam Hussein era bom, assim como as armas químicas que utilizava contra os iranianos e os curdos. Depois, passou a ser mau. Passou a chamar-se Satã Hussein quando os Estados Unidos, que acabavam de invadir o Panamá, invadiram o Iraque porque o Iraque tinha invadido o Kowait. Bush pai encarregou-se desta guerra contra o Mal. Com o espírito humanitário e pleno de compaixão que caracteriza a sua família, matou mais de cem mil iraquianos, na sua maioria civis.
Satã Hussein continua no seu posto, mas este inimigo número um perdeu o lugar e já só é número dois. A praga do mundo chama-se agora Osama Bin Laden. A CIA ensinou-lhe tudo o que ele sabe em matéria de terrorismo: Bin Laden, amado e armado pelo governo dos Estados Unidos, era um dos principais guerreiros da liberdade contra o comunismo no Afeganistão.
Bush pai ocupava a vice-presidência quando o Presidente Reagan declarou que estes heróis eram “o equivalente moral dos pais fundadores da América”. Hollywood estava de acordo com a Casa Branca. Foi nessa época que se filmou o Rambo 3: os afegãos muçulmanos eram os bons. Hoje são os piores dos maus, no tempo de Bush filho, treze anos mais tarde.
Henry Kissinger foi um dos primeiros a reagir face à recente tragédia. “Tão culpados quanto os terroristas são aqueles que lhes deram apoio, financiamento e inspiração”, foi a sua sentença, retomada pelo Presidente Bush poucas horas mais tarde. Se assim é, devia-se começar por bombardear Kissinger. Ele será culpado de muitos mais crimes do que os cometidos por Bin Laden e por todos os terroristas que existem no mundo. E em muitos mais países: agindo por conta de vários governos americanos, levou “apoio, financiamento e inspiração” ao terrorismo de Estado na Indonésia, no Cambodja, no Chipre, nas Filipinas, na África do Sul, no Irão, no Bangladesh, e nos países sul-americanos que sofreram a guerra suja do Plano Condor.
A 11 de Setembro de 1973, vinte e oito anos antes das chamas recentes, ardia o palácio presidencial no Chile. Kissinger tinha antecipado o epitáfio de Salvador Allende e da democracia chilena, comentando os resultados das eleições:”Nós não podemos aceitar que um país se torne marxista por causa da irresponsabilidade do seu povo”.
O desprezo pela vontade do povo é uma das muitas coincidências entre o terrorismo de Estado e o terrorismo privado. Por exemplo, a ETA, que mata em nome da independência do País Basco, diz através de um dos seus porta-vozes:”Os direitos não têm nada a ver com maiorias e minorias”.
Há muitos pontos comuns entre terrorismo artesanal e o terrorismo de alto nível tecnológico, entre o dos fundamentalistas religiosos e os fundamentalistas do mercado, o dos desesperados e o dos poderosos, o dos loucos isolados e o dos profissionais de uniforme. Todos partilham o mesmo desprezo pela vida humana: os assassinos dos cinco mil cidadãos esmagados sob os escombros das Torres Gémeas e os assassinos dos vinte mil guatemaltecos, na maioria indígenas, que foram exterminados sem que jamais a televisão ou os jornais do mundo lhes tenham prestado a mínima atenção. Esses, os guatemaltecos, não foram sacrificados por nenhum fanático muçulmano, mas pelos militares terroristas que receberam “apoio, financiamento e inspiração” dos governos dos Estados Unidos.
Todos os amantes da morte coincidem também na sua obsessão em reduzir a termos militares as contradições sociais, culturais e nacionais. Em nome do Bem, da Verdade única, todos resolvem tudo matando primeiro e levantando as questões depois. Deste modo, acabam por favorecer o inimigo que combatem.
Foram as atrocidades do Sendero Luminoso que prepararam o terreno do Presidente Fujimori, que, com um considerável apoio popular, implantou um regime de terrror e vendeu o Peru por tuta-e-meia. Foram as atrocidades dos Estados Unidos no Médio Oriente que prepararam o terreno da guerra santa do terrorismo de Alá.
Embora agora o líder da civilização exorte a uma nova cruzada, Alá está inocente dos crimes que se cometem em seu nome… afinal de contas, Deus não ordenou o holocausto nazi contra os fiéis de Jeová e não foi Jeová quem ditou o massacre de Sabra e Chatila, nem quem mandou expulsar os palestinianos da sua terra.
Uma tragédia de equívocos: já não se sabe quem é quem. O fumo das explosões faz parte de uma cortina de fumo bem mais espessa ainda, que nos impede de ver. De vingança em vingança, os terrorismos obrigam-nos a caminhar titubeando. Olho uma fotografia recente: numa parede de Nova Iorque alguém escreveu: “O olho por olho torna o mundo cego”. A violência gera violência e também a dor, o medo, o ódio e a loucura.
GALEANO, Eduardo,”O teatro do Bem e do Mal”, O Império em guerra, Porto, Campo das Letras, 2002.
Tal como o nome sugere, não se trata de um filme, mas antes um conjunto de onze pequenas obras cinematográficas - de outros tantos autores – apresentadas sequencialmente e orquestradas sob a batuta do maestro do projecto, o reputado cineasta francês Claude Lelouch.
Partindo do atentado contra o World Trade Center, a obra não se restringe à inspiração dos trágicos eventos do 11 de Setembro de 2001. Tem o especial condão de ser, que se saiba, o primeiro olhar cinematográfico a que os acontecimentos daquele dia deram origem. A primeira constatação, inevitável, é a heterogeneidade de estilos evidenciada na arte de filmar.
A liberdade na concepção das curtas-metragens, desde logo apresentado pela produção como um objectivo primordial, acaba por se traduzir naturalmente nos trabalhos filmados pelos onze cineastas.
À partida, não se esperaria que um realizador do Burkina-Faso ou do Irão dispusesse dos mesmos expedientes (sobretudo ao nível da produção) dos seus colegas europeus da França ou Inglaterra e essa diferença de cadências produtivas acaba mesmo por se revelar um dos pontos de maior interesse nesta obra de conjunto.
Por outro lado, uma outra evidência salta à vista. Apesar do rol de realizadores preencher os vários cantos do mundo (Europa Ocidental e Oriental, América do Norte e Central, Norte de Africa e Austral, Extremo Oriente e Sudeste Asiático), não deixa de ser notório a falta de um representante da América do Sul (o México acaba por ser o único consignatário latino americano, com um cinema cada vez mais próximo do vizinho do norte que do universo cinematográfico reconhecido a sul das Caraíbas).
De resto, dos países envolvidos no projecto constam: Irão, França, Israel, India, Egipto, México, EUA, Inglaterra, Burkina-Faso, Bósnia-Herzegovina e Japão. Podemos mesmo afirmar, que 11 Perspectivas apresenta-se assim como um autêntico festival cinematográfico e multicultural inserido numa só obra. 11 perspectivas de autor (entre eles alguns nomes bem emblemáticos como Chahine, Lelouch, Loach ou Imamura) de um só drama.
alberto guerreiro | milton dias
Realizado por Youssef Chahine, Amos Gitai, Shohei Imamura, Claude Lelouch, Ken Loach, Mira Nair, Idrissa Ouedraogo, Sean Penn, Samira Makhmalbaf, Danis Tanovic, Alejandro González Iñárritu.
França / Reino Unido, 2002
11 realizadores de 11 países filmam 11 curtas de 11 minutos e 9 segundos sobre o 11 de Setembro. 11 olhares diferentes de um pouco de todo o mundo.
08_09:
"11'09"01 – 11 Perspectivas " de Youssef Chahine, Amos Gitai, Shohei Imamura, Claude Lelouch, Ken Loach, Mira Nair, Idrissa Ouedraogo, Sean Penn, Samira Makhmalbaf, Danis Tanovic, Alejandro González Iñárritu.
15_09:
08_09:
"Fahrenheit 9/11" de Michael Moore
22_09:
"Persona Non Grata" de Oliver Stone
Em órbita (sessões especiais da 7.ª à 5.ª)
29_09:
"Terra da Abundância" de Wim Wenders
Em órbita do ciclo Dogma 95, apresenta-se o primeiro grande filme de um dos seus fundadores. Longe da génese do movimento, Europa de Lars von Trier reflecte no entanto grande parte dos fundamentos estéticos e conceptuais da obra deste autor dinamarquês. A visão experimentalista e dogmática sobre o cinema, que influenciará o próprio movimento pela mão de Trier estão aqui bem presentes.
Europa
Em 1991, um filme causou sensação pela sua qualidade plástica e conceptual. Esse filme foi sem dúvida alguma Europa de Lars von Trier. Deu a conhecer ao mundo um novo mestre do cinema que mesmo antes já tinha marcado presença significativa no contexto audiovisual com dois registos televisivos importantes: Medeia (1987) e Epidemia (1988). No entanto, estas duas produções, de amplitude mais restrita, só teriam o seu reconhecimento depois do aparecimento de Europa quando este ganhou o grande prémio do júri de Cannes.
A personagem principal de Europa (magistralmente interpretada por Jean-Marc Barr), um jovem americano nascido na Alemanha, regressa à terra natal para ajudar à reconstrução do pós-guerra, acabando por se embrenhar numa epifania simultaneamente individual (em que se conhece a si próprio) e colectiva, do estado/nação/continente à deriva. A Europa e a consciência de ser europeu são temas recorrentes em Trier: está presente logo no seu primeiro registo filmado, em Elemento do Crime (1982) onde neste thriller psicológico a Europa é tida como um só país.
Trier é um seguidor confesso de Carl T. Dryer (1889 - 1968), um dos expoentes máximos dos primórdios do cinema europeu e a grande referência clássica do cinema dinamarquês. A reverência está presente de forma evidente não só ao nível plástico (estético) mas igualmente ao nível formal e conceptual na elaboração de histórias pesadas, dando enfoque ao lado mais negro da existência humana e na construção de enredos que enaltecem o desencanto do mundo cujos finais parecem constituir nenhuma esperança. Europa, é um dos grandes exemplos dessa herança artística e cultural. Mas Trier é igualmente um cinéfilo assumido. Europa, por exemplo, faz homenagem à cinematografia surrealista de inicio do século XX de Buñuel e Rene Clair.
O filme suplanta tudo e todos através da narração (a voz pausada de Max von Sydow), de teor descritivo e ambição hipnótica, que contribui para a criação de um tom fabular cada vez mais contrastante à medida que o filme avança. A fábula encarnada no personagem principal, é o do próprio “velho continente” que se afunda – personificada no afogamento de Leopold Kessler - no momento em que é dada a destruição da sombria Alemanha nazi ergue-se uma nova ordem mundial. Nasce, nesse instante, uma nova Europa!
Aos 42 anos, Lone Scherfig é autora de dois filmes memoráveis na esfera cinéfila (The Birthday Trip e On Our Own). Assinou também vários trabalhos para a rádio, televisão e teatro. Hoje, o seu belo ITALIANO PARA PRINCIPIANTES ganhou o Urso de Prata do último festival de Berlim.
O que é que a seduzia na realização de um filme Dogma?
Lone Scherfig – Primeiro, poder fazer o que queria. (...) Depois, a ligeireza da produção. Do primeiro dia do argumento até ao último dia de montagem, as coisas desenrolaram-se incrivelmente rápido. Não tive que sofrer o peso de uma produção “normal” onde, por vezes, ficamos vários dias a rodar uma cena de um minuto.
Lars von Trier interveio muito?
Lone Scherfig – Estudámos na mesma escola de cinema. Pertencia ao ano anterior ao meu. Produziu também uma das minhas séries de televisão. Lars comportou-se comigo como um colega. É um excelente produtor. Conhece de cor as três versões sucessivas do argumento. E pode dar-me conselhos sensatos sobre o sítio em que colocar esta ou aquela cena.
O seu filme prefere o humor ao drama...
Lone Scherfig – O que eu temo sobretudo é a pretensão.
Porque este fascínio pela Itália?
Lone Scherfig – Fantasma escandinavo... Mas, enfim, tinha vontade de filmar
O. D. B., Première
Janeiro 2002
Lone Scherfig – “A Festa” impressionou-me muito tal como o seu sucesso merecido. A simplicidade das regras do Dogma parece-me uma boa maneira de construir um filme ligeiro tanto no plano da rodagem como o do argumento. A história pode parecer simples: ela é como a terra que é enriquecida pelo trabalho dos actores para chegar mais longe na verdade das personagens. Para além dos seis actores, foi também o local da rodagem que deu origem ao aspecto de “pequena cidade” desta comunidade de destinos. Foi tudo filmado à volta de Filmbyen.
Cada personagem do filme perde algo ou alguém. Qual é para si o preço da vida?
Lone Scherfig – O filme comporta um aspecto dramático e um aspecto cómico. Dramático porque as dificuldades que as minhas personagens encontram dão esse tom: amar alguém e dizer-lhe é sem dúvida a verdadeira questão de todas as personagens e não é uma questão fácil. Cómico porque as personagens são seres humanos por inteiro, ou seja com uma real complexidade. É o olhar que eu tenho sobre eles que faz pender a balança para um lado ou para outro. Por exemplo a personagem de Halvfinn, o empregado fã do clube de futebol Juventus. No início, no argumento, era um personagem mais resmungão, passando o tempo a dizer as verdades às pessoas. Depois, no filme, Halvfinn é divertido e impertinente. Traz muito dinamismo ao filme. Cada um deles é dramático e cómico. Se cada personagem perde alguém ou algo, encontra outra pessoa ou outra coisa no final do filme; cada um à sua maneira. O final do filme é um happy end sobre a possibilidade de serem eles próprios, apesar de tudo.
Através do seu filme, temos uma impressão de solidão que se desprende dos lugares, dos cenários, da paisagem...
Lone Scherfig – A impressão de solidão é provocada pelo facto de termos filmado no Inverno. Parece-me uma boa tela de fundo para realçar o que me interessa: as personagens. Queria que a atenção do espectador se concentrasse nas personagens e nas suas histórias. É uma implicação do espectador muito diferente da que provoca o star system. Um filme com as regras do Dogma mergulha o espectador num universo muito quotidiano. É isso que é interessante nesta aposta: cada espectador pode identificar-se com o conjunto das personagens e não apenas com uma delas. Como queria estar próxima deles, privilegiei o rosto dos actores. Não é um filme de paisagens mas sim um documentário dos sentimentos.
As regras do Dogma não alteram por completo a possibilidade de tornar belos os actores que filma...
Lone Scherfig – Penso que as regras do Dogma permitem dar tempo ao olhar. Os actores tornam-se então muito bonitos. Gosto muito deles.
No seu périplo a Veneza, no final do filme, há uma cama que permite uma cena romântica...
Lone Scherfig – Isso fez parte das surpresas fabulosas que as regras do Dogma permitem. Tudo está lá na vida e só preciso agarrá-lo, captá-lo. Em Veneza, quando Halvfinn e Karen vão para uma ruela afastados dos olhares, estava lá realmente uma cama, ali como caída do céu e para grande felicidade do filme. Se a cama não estivesse lá, não a teria imaginado. É uma das condições do Dogma. Rodagem rápida, ligeira, o mais perto possível da realidade. Enquanto cineasta, desembaraçamo-nos de uns quantos artifícios para chegar ao essencial: confiar no real, acreditar na vida e aceitá-la.
Entrevista por Malika Aït Gherbi,
coordenadora nacional da Association Française des Cinémas d’Art et d’Essai